sábado, 20 de setembro de 2008

GERALDO REIS: O SER SENSÍVEL: METANÁUTICA

GERALDO REIS: O SER SENSÍVEL: METANÁUTICA

SEPARAÇÃO DIVÓRCIO INVENTÁRIO PARTILHA ADMINISTRATIVOS PROCEDIMENTOS EM CARTÓRIO

ATENÇÃO COLEGAS!

Resolução nº 35, de 24 de abril de 2.007 - Disciplina a aplicação da Lei nº 11.441107 pelos Serviços Notariais e de Registro
A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais, e tendo em vista o disposto no art. 19, I, do Regimento Interno deste Conselho, e Considerando que a aplicação da Lei no 11.441/2007 tem gerado muitas divergências;

Considerando que a finalidade da referida lei foi tornar mais ágeis e menos onerosos os atos a que se refere e, ao mesmo tempo, descongestionar o
Poder Judiciário;

Considerando a necessidade de adoção de medidas uniformes quanto à aplicação da Lei no 11.44112007 em todo o território nacional, com vistas a prevenir e evitar conflitos;

Considerando as sugestões apresentadas pelos Corregedores-Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal em reunião promovida pela Corregedoria Nacional de Justiça;

Considerando que, sobre o tema, foram ouvidos o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação dos Notários e Registradores do Brasil;

RESOLVE:

SEÇÃO I
DISPOSIÇÕES DE CARÁTER GERAL

Art. 1º Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei no 11.441107, é livre a escolha do tabelião de notas, não se aplicando as regras de competência do Código de Processo Civil.

Art. 2º O É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial.

Art. 3º As escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores (DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas, etc.)

Art. 4º O valor dos emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados, conforme estabelecido no parágrafo único do art. l0 da Lei no 10.169/2000, observando-se, quanto a sua fixação, as regras previstas no art. 2O da citada lei.

Art. 5º É vedada a fixação de ernolumentos em percentual incidente sobre o valor do negócio jurídico objeto dos serviços notariais e de registro (Lei nº 10.169, de 2000, art. 3 O , inciso 11).

Art. 6º A gratuidade prevista na Lei no 11.441/07 compreende as escrituras de inventário, partilha, separação e divórcio consensuais.

Art. 7º Para a obtenção da gratuidade de que trata a Lei nº 11.441/07, basta a simples declaração dos interessados de que não possuem condições de arcar com os emolumcntos, ainda que as partes estejam assistidas
por advogado constituído.

Art. 8º É necessária a presença do advogado, dispensada a procuração, ou do defensor público, na lavratura das escrituras decorrentes da Lei 11.441107, nelas constando seu nome e registro na OAB.

Art. 9º É vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes, que deverão comparecer para o ato notarial acompanhadas de profissional de sua confiança. Se as partes não dispuserem de condições econômicas para contratar advogado, o tabelião deverá recomendar-lhes a Defensoria Pública, onde houver, ou, na sua falta, a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil.

Art. 10º É desnecessário o registro de escritura pública decorrente da Lei nº 11.441/2007 no Livro "E" de Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais, entretanto, o Tribunal de Justiça deverá promover, no prazo de 180 dias, medidas adequadas para a unificação dos dados que concentrem as informações dessas escrituras no âmbito estadual, possibilitando as buscas, preferencialmente, sem ônus para o interessado.


SEÇÃO II
DISPOSIÇOES REFERENTES AO INVENTÁRIO E A PARTILHA

Art 11º É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública de inventário e partilha, para representar o espólio, com poderes de inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes, sem necessidade de seguir a ordem prevista no art. 990 do Código de Processo Civil.

Art. 12º Admitem-se inventário e partilha extrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capazes, inclusive por emancipação, representado(s) por procuração formalizada por instrumento público com poderes especiais, vedada a acumulaçáo de funções de mandatário e de assistente das partes.

Art. 13º A escritura pública pode ser retificada desde que haja o consentimento de todos os interessados. Os erros materiais poderão ser corrigidos, de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes, ou de seu procurador, por averbação à margem do ato notarial ou, não havendo espaço, por escrituração própria lançada no livro das escrituras públicas e anotação remissiva.

Art. 14º Para as verbas previstas na Lei no 6.858180, é também admissível a escritura pública de inventário e partilha.

Art. 15º O recolhimento dos tributos incidentes deve anteceder a lavratura da escritura.

Art. 16º É possível a promoção de inventário extrajudicial por cessionário de direitos hereditários, mesmo na hipótese de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros estejam presentes e concordes.

Art. 17º Os cônjuges dos herdeiros deverão comparecer ao ato de lavratura da escritura pública de inventário e partilha quando houver renúncia ou algum tipo de partilha que importe em transmissão, exceto se o casamento se der sob o regime da separação absoluta.

Art. 18º O(A) companheiro(a) que tenha direito à sucessão é parte, observada a necessidade de ação judicial se o autor da herança não deixar outro sucessor ou não houver consenso de todos os herdeiros, inclusive quanto ao reconhecimento da união estável.

Art. 19º A meação de companheiro(a) pode ser reconhecida na escritura pública, desde que todos os herdeiros e interessados na herança, absolutamente capazes, estejam de acordo.

Art. 20º As partes e respectivos dnjuges devem estar, na escritura, nomeados e qualificados (nacionalidade; profissão; idade; estado civil; regime de bens; data do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; número do documento de identidade; número de inscrição no CPFIMF; domicílio e residência).

Art. 21º A escritura pública de inventário e partilha conterá a qualificação completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança; data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de serviço em que consta o registro do óbito; e a menção ou declaração dos herdeiros de que o autor da herança não deixou testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei.

Art. 22º Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos: a) certidão de óbito do autor da herança; b) documento de identidade oficial e CPF das partes e do autor da herança; c) certidão comprobatória do vínculo de parentesco dos herdeiros; d) certidão de casamento
do cônjuge sobrevivente e dos herdeiros casados e pacto antenupcial, se houver;
e) certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos; f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis e
direitos, se houver; g) certidão negativa de tributos; e h) Certificado de Cadastro
de Imóvel Rural - CCIR, se houver imóvel rural a ser partilhado.

Art. 23º Os documentos apresentados no ato da lavratura da escritura devem ser originais ou em cópias autenticadas, salvo os de identidade das partes, que sempre serão originais.

Art. 24º A escritura pública deverá fazer menção aos documentos apresentados.

Art. 25º É admissivel a sobrepartilha por escritura pública, ainda que referente a inventário e partilha judiciais já findos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse menor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judicial.

Art. 26º Havendo um só herdeiro, maior e capaz, com direito à totalidade da herança, não haverá partilha, lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens.

Art. 27º A existência de credores do espólio não impedirá a realização do inventário e partilha, ou adjudicação, por escritura pública.

Art. 28º É admissivel inventário negativo por escritura pública.

Art. 29º É vedada a lavratura de escritura pública de inventário e partilha referente a bens localizados no exterior.

Art. 30º Aplica-se a Lei nº 11.441/07 aos casos de óbitos ocorridos antes de sua vigência.

Art. 31º A escritura pública de inventário e partilha pode ser lavrada a qualquer tempo, cabendo ao tabelião fiscalizar o recolhimento de eventual multa, conforme previsão em legislação tributária estadual e distrital específicas.

Art. 32º O tabelião poderá se negar a lavrar a escritura de inventário ou partilha se houver fundados indícios de fraude ou em caso de dúvidas sobre a declaração de vontade de algum dos herdeiros, fundamentando a recusa por escrito.


SEÇÃO III
DISPOSIÇOES COMUNS A SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO CONSENSUAIS

Art. 33º Para a lavratura da escritura pública de separação e de divórcio consensuais, deverão ser apresentados: a) certidão de casamento; b) documento de identidade oficial e CPFIMF; c) pacto antenupcial, se houver; d) certidão de nascimento ou outro documento de identidade oficial dos filhos absolutamente capazes, se houver; e) certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos; e f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis e direitos, se houver.

Art. 34º As partes devem declarar ao tabelião, no ato da lavratura da escritura, que não têm filhos comuns ou, havendo, que são absolutamente capazes, indicando seus nomes e as datas de nascimento.

Art. 35º Da escritura, deve constar declaração das partes de que estão cientes das conseqüências da separação e do divórcio, firmes no propósito de pôr fim à sociedade conjugal ou ao vínculo matrimonial, respectivamente, sem hesitação, com recusa de reconciliação.

Art. 36º O comparecimento pessoal das partes é dispensável à lavratura de escritura pública de separação e divórcio consensuais, sendo admissível ao(s) separando(s) ou ao(s) divorciando(s) se fazer representar por mandatário constituído, desde que por instrumento público com poderes especiais, descrição das cláusulas essenciais e prazo de validade de trinta dias.

Art. 37º Havendo bens a serem partilhados na escritura, distinguirse-á o que é do patrimônio individual de cada cônjuge, se houver, do que é do patrimônio comum do casal, conforme o regime de bens, constando isso do corpo da escritura.

Art. 38º Na partilha em que houver transmissão de propriedade do patrimônio individual de um cônjuge ao outro, ou a partilha desigual do patrimônio comum, deverá ser comprovado o recolhimento do tributo devido sobre a fração transferida.

Art. 39º A partilha em escritura pública de separação e divórcio consensuais far-se-á conforme as regras da partilha em inventário extrajudicial, no que couber.

Art. 40º O traslado da escritura pública de separação e divórcio consensuais será apresentado ao Oficial de Registro Civil do respectivo assento de casamento, para a averbação necessária, independente de autorização judicial e de audiência do Ministério Público.

Art. 41º Havendo alteração do nome de algum cônjuge em razão de escritura de separação, restabelecimento da sociedade conjugal ou divórcio consensuais, o Oficial de Registro Civil que averbar o ato no assento de casamento também anotará a alteração no respectivo assento de nascimento, se de sua unidade, ou, se de outra, comunicará ao Oficial competente para a necessária anotação.

Art. 42º Não há sigilo nas escrituras públicas de separação e divórcio consensuais.

Art. 43º Na escritura pública deve constar que as partes foram orientadas sobre a necessidade de apresentação de seu traslado no registro civil do assento de casamento, para a averbação devida.

Art. 44º É admissível, por consenso das partes, escritura pública de retificação das cláusulas de obrigações alimentares ajustadas na separação e no divórcio consensuais.

Art. 45º A escritura pública de separação ou divórcio consensuais, quanto ao ajuste do uso do nome de casado, pode ser retificada mediante declaração unilateral do interessado na volta ao uso do nome de solteiro, em nova escritura pública, com assistência de advogado.

Art. 46º O tabelião poderá se negar a lavrar a escritura de separação ou divórcio se houver fundados indícios de prejuízo a um dos cônjuges ou em caso de dúvidas sobre a declaração de vontade, fundamentando a recusa por escrito.


SEÇÃO IV
DISPOSIÇÕES REFERENTES A SEPARAÇÃO CONSENSUAL

Art. 47º São requisitos para lavratura da escritura pública de separação consensual: a) um ano de casamento; b) manifestação da vontade espontânea e isenta de vícios em não mais manter a sociedade conjugal e desejar a separação conforme as cláusulas ajustadas; c) ausência de filhos menores não emancipados ou incapazes do casal; e d) assistência das partes por advogado, que poderá ser comum.

Art. 48º O restabelecirnento de sociedade conjugal pode ser feito por escritura pública, ainda que a separação tenha sido judicial. Neste caso, é necessária e suficiente a apresentação de certidão da sentença de separação ou da averbação da separação no assento de casamento.

Art. 49º Em escritura pública de restabelecimento de sociedade conjugal, o tabelião deve: a) fazer constar que as partes foram orientadas sobre a necessidade de apresentação de seu traslado no rcgistro civil do assento de casamento, para a averbação devida; b) anotar o restabelecirnento à margem da escritura pública de separação consensual, quando esta for de sua serventia, ou, quando de outra, comunicar o restabelecimento, para a anotação necessária na serventia competente; e c) comunicar o restabelecimento ao juízo da separação judicial, se for o caso.

Art. 50º A sociedade conjugal não pode ser restabelecida com modificações.

Art. 51º A averbação do restabelecimento da sociedade conjugal somente poderá ser efetivada depois da averbação da separação no registro civil, podendo ser simultâneas.


SEÇÃO V
DISPOSIÇÕES REFERENTES AO DIVÓRCIO CONSENSUAL

Art. 52º A Lei nº 11.441/07 permite, na forma extrajudicial, tanto o divórcio direto como a conversão da separação em divórcio. Neste caso, é dispensável a apresentação de certidão atualizada do processo judicial, bastando a certidão da averbaçáo da separação no assento de casamento.

Art. 53º A declaração dos cônjuges não basta para a comprovação do implemento do lapso de dois anos de separação no divórcio direto. Deve o tabelião observar se o casamento foi realizado há mais de dois anos e a prova documental da separação, se houver, podendo colher declaração de testemunha, que consignará na própria escritura pública. Caso o notário se recuse a lavrar a escritura, deverá formalizar a respectiva nota, desde que haja pedido das partes neste sentido.

Art. 54º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.


Ministra Ellen Gracie
Presidente
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sexta-feira, 5 de setembro de 2008

união estável e a sucessão do companheiro sobrevivente à luz do novo código civil

Li, gostei, achei interessante e sobremaneira útil. Divulgo, portanto.



União estável e a sucessão do companheiro sobrevivente à luz do novo código civil

Rita de Cássia Andrade

SUMÁRIO: 1. Introdução- 2. Dos direitos patrimoniais e sucessórios dos companheiros instituídos através das Leis 8.971/94 e 9.278/96 – 3. Das alterações discriminatórias e de exclusão constantes no novo Código Civil de 2002 – 4. Da ordem constitucional, doutrinária, jurisprudencial e sumular sobre a matéria sucessória e direito real de habitação no imóvel familiar 5. Da declaração de inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC inserido nas Disposições Gerais do Livro das Sucessões- – 6. Conclusão.

1. Introdução

A Constituição Federal de 1988 em seu art. 226 elevou a união estável entre o homem e a mulher ao status de família, dispondo em seu § 3º, “que é reconhecida união estável entre o homem e a mulher, como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”. Já no § 4º, do mesmo art. reza que “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. É a denominada família mono parental.
Essa proteção constitucional às famílias de fato ou naturais, de elevadas proporções e causas diversas em nosso país, foi alvo de muitos questionamentos por parte dos legisladores e daqueles que se dedicam ao estudo e aplicação do direito, surgindo as Leis 8.971/94 e 9.278/96, que foram as primeiras indicações normativas de desdobramento do pressuposto constitucional, representando a vontade da Lei Maior, na flexibilização das relações interpessoais, conduzindo o processo de democratização das mais variadas formas de relacionamento atual.

2. Dos Direitos Patrimoniais e Sucessórios dos companheiros instituídos através das leis 8.971/94 e 9.278/96

A lei 8.971/94 regulamentou a questão dos alimentos devido à companheira ou companheiro, bem assim a questão sucessória. Pois, até então, a jurisprudência havia adiantado técnicas de proteção ao companheiro supérstite, mas foi a partir desse novo imperativo legal que a morte de um dos conviventes foi movida para o âmbito do direito das sucessões. Garantiu-se o direito de participar da sucessão aberta, seja como usufrutuário, seja como herdeiro, vindo em terceiro lugar na ordem da vocação hereditária.
Sendo que a Lei 9.278/96, ao estabelecer a igualdade de direitos e deveres entre os conviventes, impõe, ainda, o direito real de habitação ao companheiro sobrevivo, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, levando em conta, sobretudo, o comprometimento emocional e amoroso que se manteve naquele lar, as lembranças e toda a história de vivência familiar.

3.Das alterações discriminatórias e de exclusão constantes no novo Código Civil de 2002

O novo Código Civil de 2002, em seu art. 1.723, caput, e seus §§ 1º e 2º, reconhece os elementos indicadores do instituto da união estável, a qual se configura através da convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, entre o homem e a mulher, inclusive entre pessoas casadas que se acharem separadas de fato ou judicialmente.
Pontifica, ainda, em seu art. 1.725 que “Na união estável, salvo contrato escrito entre companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”. Ou seja, os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes na constância da união estável, e a titulo oneroso, pertencem a ambos, em partes iguais.
Entretanto, ao tratar da sucessão legítima e da ordem da vocação hereditária, se refere apenas aos descendentes; aos ascendentes em concorrência com o cônjuge; ao cônjuge sobrevivente, se este ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de 2 (dois) anos; e aos colaterais, colocando a companheira ou o companheiro de fora dessa ordem, permitindo apenas a sua participação na sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união, e concorrendo, com os filhos comuns do casal, os descendentes só do autor da herança e outros parentes sucessíveis. E só não havendo parentes sucessíveis terá direito à totalidade da herança, conforme disposição do art. 1790 da Lei Substantiva Civil.
Assim, em havendo bens adquiridos antes da união estável, a titulo oneroso o companheiro não terá direito sucessório sobres esses. Destacando-se, que se os bens forem adquiridos a titulo gratuito (ex: doação, herança, prêmios, etc.) o companheiro sobrevivente também estará excluído da sucessão. Participando dela apenas seus descendentes, ascendentes ou colaterais. De igual modo, o direito de habitação e o usufruto decorrente da viuvez também foram excluídos dos companheiros.
Vê-se, portanto, que o novo regramento do CC vem acarretar sérios entraves e enormes prejuízos aos que vivem sob o manto da união estável, pois até a participação destes na sucessão dos bens adquiridos a titulo oneroso se concorrer com filhos comuns terá direito a uma quota equivalente a que por lei for atribuída a cada filho; se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe á a metade da herança do que couber a cada um daqueles; se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a 1/3 (um terço) da herança; e não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. Ou seja, o companheiro só terá direito à integralidade da herança, se não houver descendentes, ascendentes ou colaterais.
Vale dizer que a redação do art. 1.790 do Código Civil, enfatiza que os bens que fazem parte da herança, com relação ao companheiro são apenas aqueles adquiridos onerosamente na vigência da união estável, deixando de fora todos os bens adquiridos antes do inicio da união, seja a titulo gratuito ou oneroso. Assim, se o companheiro possuir bens antes da união estável, e vier a falecer sem deixar ascendentes, descentes ou colaterais até o 4º grau, o companheiro sobrevivente não terá direito a sucessão, seguindo a ordem de vocação hereditária prevista no artigo 1.844, onde os bens serão entregues ao município por ser considerada herança jacente.
Diante dessa reversão do legislador, forçoso reconhecer-se que muitos dos direitos historicamente conquistados pelos companheiros após anos de formulação doutrinária e jurisprudencial, restaram extremamente reduzidos pelas novas ordens jurídicas que disciplinam a matéria, o que seguramente será motivo de muitas disputas judiciais onde o julgador, na aplicação da lei, deverá ter como referência a realidade das famílias contemporâneas, buscando ajustar a nova legislação aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Na nova ordem de transmissão hereditária, visível é a distinção entre a união estável e o casamento, porquanto os casados voltam a ter um amparo legal superior aos companheiros por força da revogação das leis 8.971/94 e 9.278/96 que praticamente equiparavam a união estável ao casamento, tanto para o efeito de divisão de bens como na questão de herança. Perdendo o companheiro sobrevivente a condição de depositário de direito real, e a terceira posição na ordem sucessória, através dessa subversão hermenêutica, violando frontalmente o comando constitucional.
Contudo diante desse desnivelamento do novo regramento civil, ergue-se o seguinte questionamento: Teria sido uma postura proposital do nosso legislador? Infelizmente entendemos que sim, talvez visando uma ação pro ativa do Poder Judiciário, esquecendo-se que não são todos que tem acesso à Justiça.
Todavia, entendemos que uma vez reconhecida à união estável, representada pela convivência duradoura e continua, entre um homem e uma mulher, podendo até não coabitar, mas que, solteiros ou casados, desde que separados de fato ou judicialmente, divorciados ou viúvos, se apresente o casal aos olhos da sociedade como se fossem marido e mulher. Estando ainda unidos pela intenção de constituírem uma verdadeira família, essa relação tem origem constitucional, é reconhecida uma entidade familiar, cujo conceito se estende também à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, conforme §§3º e 4º do artigo 226 da CF. Cabendo, portanto, ao legislador ordinário, acompanhar a realidade social, contemplando as inquietações da família atual, devendo o companheiro receber o mesmo tratamento dedicado ao cônjuge, pois ao colocar um na condição de herdeiro necessário e o outro numa situação de concorrência com tios e avós, coloca os participantes de união estável, na sucessão hereditária, numa posição de extrema inferioridade e injustiça.

4. Da ordem constitucional, doutrinária, jurisprudencial e sumular sobre a matéria sucessória e direito real de habitação no imóvel familiar


Sabemos que de vinte e cinco autores, vinte um entendem que o companheiro sobrevivente tem direito a metade da herança deixada pelo de cujus disputando na mesma igualdade com os herdeiros necessários, previsto no artigo 1.845 e 1.846 do Código Civil de 2002.
Em decisão inovadora, o TJRS, no julgamento do Agravo de Instrumento 700200389284, equipara companheiro a cônjuge, considerando inconstitucional o art. 1790, III, do Código Civil, que prevê a concorrência do companheiro com colaterais, concedendo ao companheiro o direito à totalidade da herança, em detrimento do irmão da companheira falecida.
Dentre os argumentos expendidos na decisão é que tanto a família de direito, como também àquela que se constitui por simples fato, há que se outorgar a mesma proteção legal, em observância ao principio da equidade, assegurando-se igualdade de tratamento entre cônjuge e companheiro, inclusive no plano sucessório, sob pena de incorrer em odiosa diferenciação, deixando ao desamparo a família constituída pela união estável, e conferindo proteção legal privilegiada à família constituída de acordo com as formalidades da lei. Reconhecendo, portanto, não ser possível violar a dignidade do homem, por apego absurdo a formalismos legais.
O Conselho da Justiça Federal na I Jornada de Direito Civil, relativa à Direito de Família e Sucessão, aprovou o Enunciado de nº 117, relacionado ao art. 1.831 do CCB, disciplinando que “O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da lei 9.278/96, seja em razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/88”. Ou seja, o direito real de habitação no imóvel destinado à residência da família não deve ser prerrogativa apenas do cônjuge sobrevivente, mas também do companheiro, como direito social de moradia, constituindo um verdadeiro retrocesso a falta de ressalva no Código Civil sobre o direito real de habitação na dissolução da união estável.
Os Juízes das unidades da Família e das Sucessões do Estado de São Paulo deliberaram e formularam enunciados para nortear as decisões, a exemplo do enunciado 49 o qual dispõe que o art. 1790 do Código Civil, ao tratar de forma diferenciada a sucessão legítima do companheiro em relação ao cônjuge, incide em inconstitucionalidade, pois a Constituição não permite diferenciação entre famílias assentadas no casamento e na união estável, nos aspectos em que são idênticas, que os vínculos de afeto, solidariedade e respeito, vínculos norteadores da sucessão legitima.
E o enunciado 50, estabelece que ante a inconstitucionalidade do art. 1790, a sucessão do companheiro deve observar a mesma disciplina legitima do cônjuge, com os mesmos direitos e limitações, de modo que o companheiro, na concorrência com os descendentes, herda nos bens particulares, não nos quais tem meação.

5. Da declaração de inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC inserido nas Disposições Gerais do Livro das Sucessões

Diante dessa nova concepção do Código Civil, tarefa de maior urgência é a alteração legislativa, ou a declaração de inconstitucionalidade erga omnes do seu art.1790, haja vista a igualdade de tratamento dado pela CF/88, a união estável e ao casamento. Pois apesar dos julgamentos de inconstitucionalidade de forma incidental, relativamente a casos concretos e isolados, tal situação não se mostra satisfatória para a produção de uma justiça ordenada e lógica, havendo sempre decisões controvertidas para situações jurídicas iguais, na intimidade da família brasileira, uma vez que o legislador ordinário quis se sobrepuser às disposições da própria Constituição, pois apesar de se tratar de uma lei nova, a mesma passou por muitos anos de espera no Congresso Nacional, vindo a entrar em vigência já de forma totalmente ultrapassada, preconceituosa, e distante da evolução dos fatos sociais, especificamente em relação a família e sucessões.

6.Conclusão.

Observando preferentemente às concepções do direito sucessório do companheiro e do cônjuge, notadamente da forma como foi estabelecida no novo regramento civil, como já dissemos, ressalta visível afronta contra o principio fundamental da dignidade da pessoa humana firmado no art. 1º, da CF/88, bem como contra o direito de igualdade, já que o artigo 226, §3º, do Texto Constitucional deu tratamento igualitário ao instituto da união estável em relação ao casamento. Vindo, posteriormente, o Código Civil estabelecer desigualdades, criando um arsenal de novos problemas sociais e jurídicos entre as famílias constituídas sob a feição da união estável, deixando de compreender a família de acordo com os movimentos, com a evolução que se estabeleceu ao longo do tempo.
Como bem assevera Cristiano Chaves de Farias, “os novos valores que inspiram a sociedade moderna, sobrepujam e rompem, definitivamente, com a concepção tradicional de família. A arquitetura da sociedade moderna impõe um modelo familiar descentralizado, democrático, igualitário e desmatrimonializado. O escopo precípuo da família passa a ser a solidariedade social e demais condições necessárias ao aperfeiçoamento e progresso humano, regido o núcleo familiar pelo afeto, como mola propulsora”
Calha à espécie a pertinente observação, também, de Luis Edson Fachin no sentido de que é “inegável que a família, como realidade sociológica, apresenta, na sua evolução histórica, desde a família patriarcal romana até a familiar nuclear da sociedade industrial contemporânea, íntima ligação com as transformações operadas nos fenômenos sociais”.
Com essas considerações, embora o direito sucessório do companheiro tenha andado bem na sua férrea consistência sob o aspecto da divisão patrimonial e sucessório, todas as normas jurídicas editadas até hoje, entravam diante do espírito do novo Código Civil, causando indisfarçável desilusão de idéias e de sentimentos na disposição dos direitos sucessórios, com manifesta ofensa ao principio da isonomia entre cônjuge e companheiro, encontrando-se o cônjuge na terceira posição na ordem da sucessão legitima e dos herdeiros necessários (arts. 1.829 e 1.824), enquanto o companheiro aparece apenas nas Disposições Gerais do Livro das Sucessões (art. 1.790), cuja sucessão do companheiro na integralidade dos bens só é possível diante da inexistência de descendentes, ascendentes, e “parentes sucessíveis” até o quarto grau, ignorando o Código civil de 2002, de forma danosa e retrógada, todo o esforço empregado, na construção legal, doutrinária e jurisprudencial do regime da união estável, cuja forma de entidade familiar tem origem e fundamento na Constituição Federal, que reconhece o quadro evolutivo da família atrelado ao próprio avanço do homem e da sociedade.

Sobre o texto:
Texto inserido na Academia Brasileira de Direito em 27 de agosto de 2008.

Bibliografia:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
ANDRADE, Rita de Cássia. União Estável E A Sucessão Do Companheiro Sobrevivente À Luz Do Novo Código Civil. Disponível em Acesso em :5 de setembro de 2008

Autor:
Rita de Cássia Andrade

Juíza de Direito em João Pessoa/PB

Extarído do site: Academia brasileira de direito. Publicação datada de 27/8/2008